terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

ah, a paz...

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"-E permita-me ainda uma palavra - começou de novo o Mestre do Jogo dos Avelórios em voz baixa.- Gostaria de dizer-te uma coisa sobre a serenidade, a serenidade das estrelas e do espírito e também sobre nosso estilo de serenidade. Tens aversão à serenidade, provavelmente porque foste obrigado a seguir um caminho de tristeza e agora toda forma de clareza e bom humor, e especialmente a que cultivamos em Castália, parece-te superficial e infantil e igualmente covarde, uma fuga, diante do pavor dos abismos da realidade, para um mundo claro, bem-0rdenado, de puras fórmulas e fórmulas, de puras abstrações e filigranas. Mas, meu caro tristonho, vá lá que exista essa fuga, vá lá que não faltem castálicos covarde, medrosos, que brincam com puras fórmulas, que eles constituam até a maioria; isto não tira nada da genuína serenidade do céu e do espírito, não invalida o seu brilho e o seu valor.
[...]
Alcançar essa serenidade é para mim e para muitos companheiros de ideal o mais alto e o mais nobre de todos os fins. Igualmente a encontras em alguns de nossos pais da Direção da Ordem. Essa serenidade não é nem brincadeira nem vaidade, é o mais alto conhecimento e amor, é toda a realidade, é estar desperto e atento à beira das profundezas e abismos, é uma virtude dos santos e cavalheiros, é imperturbável e tende a crescer com a idade e a proximidade da morte. Ela é o segredo do belo e a mesma substância de toda arte."



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Hermann Hesse
O Jogo das Contas de Vidro

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