domingo, 7 de junho de 2009

feliz?

"Um dos maiores defeitos do amor é que, pelo menos por algum tempo, ele corre o risco de nos tornar felizes.
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O dr. Saavedra havia diagnosticado um caso de anedonia, uma doença definida pela Associação Médica Britânica como uma reação bem próxima às doenças de montanha resultantes do terror súbito trazido pela ameaça de felicidade. Era uma doença comum entre turistas naquela região da Espanha, enfrentada naquelas cercanias idílicas com a percepção súbita de que a felicidade terrena poderia estar ao alcance deles, e vítima, portanto, de uma violenta reação psicológica feita para contra-atacar essa possibilidade.

O problema com a felicidade é que, em sua raridade, ela prova ser intensamente terrível e causadora de ansiedade para ser aceita. Portanto, de uma forma um tanto inconsciente, Chloe e eu (embora eu não tivesse ficado doente), havíamos sempre tendido a localizar a hedonia ou na memória ou por antecipação. Embora a busca da felicidade fosse o objetivo central declarado, ela era acompanhada por uma crença implícita na descoberta desse aristotelianismo em algum lugar dno futuro muito distante - uma crença desafiada pelo idílio que havíamos encontrado em Aras de Alpuente e, em proporções menores, nos braços um do outro.

Por que vivíamos desse jeito? Talvez porque nos divertirmos no momento presente teria significado nos engajar numa realidade imperfeita ou perigosamente efêmera, em vez de nos escondermos por trás de uma confortável crença numa vida após a morte. Viver no futuro composto envolvia apresentar uma vida ideal para contrastar com o presente, uma que nos salvaria da necessidade de nos comprometermos com a situação que nos cerca. Era um padrão similar ao encontrado em certas religiões, segundo as quais a vida na terra é apenas um prelúdio de uma existência celestial e bem mais agradável. Nossa atitude para com feriados, festas, trabalho e talvez amor tinha algo de imortal, como se fôssemos estar na terra por tempo suficiente para não pensar nessas ocasiões como sendo finitas em número - e daí sermos forçados a extrair um valor delas. Existe conforto em viver no futuro perfeito: ele nos impede de precisar sentir que o presente é real, ou de perceber que devemos amar um ao outro ou morrer."




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alain de botton
ensaios de amor


ele me consome, gente. me consome.



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